A Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) realizou, na sexta-feira (08/10), audiência pública para debater prisões por falha no reconhecimento facial. De acordo com o relatório da Defensoria Pública do Estado juntamente com o Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (CONDEGE), ao menos 90 pessoas foram presas injustamente com base em reconhecimento fotográfico, entre 2012 e 2020.
Esse foi o caso do produtor cultural Ângelo Gustavo Nobre, de 30 anos, que ficou preso quase um ano acusado de participar do roubo de um carro na Zona Sul do Rio de Janeiro. No dia do crime, Ângelo estava em casa, onde se recuperava de uma cirurgia invasiva nos pulmões. A prisão do produtor foi sustentada no reconhecimento por uma vítima do assalto, que se baseou em uma foto nas redes sociais. Para Ângelo, o trauma da prisão injusta causou danos irreparáveis à vida dele e da família. "Fui acusado e nem os autos do processo eu encontrei. Eu, inocente, sem qualquer relação ao fato criminoso, fui afastado da minha casa, da minha família, da minha filha. Foram dias difíceis, eu pensei que minha vida tinha acabado", revelou.
A presidente da Comissão da Alerj, deputada Dani Monteiro (PSol), apresentou um levantamento feito pela Defensoria Pública do estado, segundo o qual 86,2 % das detenções injustas por reconhecimento fotográfico acabaram como prisões preventivas, que duram em média nove meses. “O que percebemos não são prisões individuais ou erros ao acaso. Há toda uma estrutura que corrobora e reafirma essas prisões injustas, e no nosso Código Penal são nítidas as etapas do reconhecimento fotográfico e como ele deve ser aplicado. Primeiro da descrição, segundo da comparação e terceiro da identificação”, explica a deputada.
Segundo a psicóloga e especialista em Justiça Criminal, Juliana Ferreira da Silva, o reconhecimento por testemunha ocular é a principal fonte de erro do judiciário. “Indicativos de pesquisas mostram que o percentual de erro das testemunhas é muito alto. Uma em cada quatro testemunhas apontam pessoas erradas quando o culpado está presente nas linhas de reconhecimento e uma em cada três testemunhas apontam pessoas erradas quando o culpado não está presente na linha de reconhecimento", afirmou a psicóloga.
Para o delegado da Polícia Civil, Gilbert Stivanello, os casos de condenações injustas a partir de reconhecimento fotográfico são exceções. Segundo ele, a Polícia Civil realizou em 2021 cerca de 8.010 reconhecimentos pessoais e 1.012 por fotografia, nos quais 7.500 foram tratados com êxito, resultando em 2.116 autos de prisão em flagrante e cerca de 1.500 pedidos de arquivamentos de indiciamentos. Stivanello defende o sistema de reconhecimento e acredita que as falhas são de condutas pessoais. “A ferramenta é necessária, e a falhas são humanas. Precisamos qualificar nossos profissionais”, comentou.
Já o deputado Waldeck Carneiro (PT) defende que, apesar dos números, as falhas no reconhecimento não são apenas exceções e erros humanos. “Por mais que os números trazidos possam indicar que o que estamos discutindo aqui são exceções, são casos que causam danos gravíssimos na vida das vítimas e de suas famílias. Há uma fortíssima incidência de vítimas negras, por mais que possa haver exceções, em decorrência de falhas humanas e documentais, essas incidências indicam falhas sistêmicas”, afirma o deputado.
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