TSE, o braço armado do Supremo
No desenho constitucional brasileiro, os poderes Legislativo e Executivo,
derivam do voto livre e soberano do povo. Esse é o fundamento central da nossa
democracia representativa e a essência da legitimação do poder.
Assegurada a lisura desses fundamentos, teremos a garantia de que suas
normas terão, no interior da sociedade, a força e a legitimidade, onde o sistema de
“freios e contra pesos”, garantirá a liberdade, a Justiça e a paz social, indispensáveis
à vida dos cidadãos.
A força desses princípios, amparados no Direito Positivo, indicará, claramente
as barreiras ou limites a serem adotados, seguidos ou atribuídos aos outros poderes
e aos agentes do Estado, delimitando as competências dele derivadas.
Assegurados os princípios gerais para a existência e o funcionamento do
Estado Democrático de Direito, com base no voto popular da maioria, seguem, no
interior da sociedade, os embates e as controvérsias do processo político, cujas
variáveis são postas nos limites da criatividade humana e de suas aspirações e na
preservação de um pacto social de liberdade e democracia.
Essa introdução óbvia, sustentou a trajetória do debate no interior da
constituinte até sua promulgação em 1988, assegurando sua legitimidade e a
possibilidade de sua alteração.
Com mais de 30 anos de vigência a Constituição Federal, consagrou a
existência de três poderes da República, o Legislativo e Executivo derivados do voto
popular e o Poder Judiciário, decorrente do texto constitucional e assegurou-lhes
parâmetros de atuação baseados nos princípios da harmonia e da independência.
As atribuições do Poder Judiciário, embora não derivem da legitimidade do voto
popular, detém as garantias constitucionais da vitaliciedade até os 75 anos de idade,
da inamovibilidade e a força mandamental em suas decisões. O poder coercitivo
dessas atribuições deve observar o equilíbrio e permanecer dentro dos limites fixados
nas linhas da Constituição.
Observa-se, porém, uma sequência de decisões monocráticas extravagantes,
cuidadosamente pinçadas do texto constitucional adjetivo, provocadas por minorias derrotadas no interior do Congresso Nacional.
Essa prática continuada dos Ministros
do Supremo, representa invasão de competência, podendo configurar-se, até mesmo,
ativismo judicial, passível de pedido Impeachment quando aplicadas fora dos limites
constitucionais.
No momento, o debate sobre adoção do voto impresso e auditável, cuja
impressão virá da própria urna eletrônica, nada diferente disso, podemos constatar a
resistência do STF e sua ingerência nas atribuições do Congresso Nacional, visando
impedir a nova modalidade do voto.
Com a necessária atenção, podemos constatar que a resistência ao voto
impresso, situa-se muito mais no STF do que propriamente na Justiça Eleitoral (Leiase TSE).
Outra grave questão que aflora nesse debate é a total subordinação da Justiça
Eleitoral aos ditames STF, embora sua estrutura faça parte dos arts.118 e119 e seus
parágrafos da Constituição Federal, essa anomalia deve ser eliminada.
O TSE composto de 07 (sete) Ministros, sendo 03 (três) do STF, 02 (dois) do
STJ e 02 (dois) da advocacia indicados pelo Supremo, onde sua presidência,
exercida, exclusivamente, por ministros do STF, indica sua fragilidade como instância
independente e autônoma, além de revelar que em sua estrutura, existem Ministros
de primeira e de segunda classe.
Mesmo diante dessa estrutura híbrida, o TSE, recentemente, recebeu, através
de jurisprudência e não da Lei, as atribuições de Tribunal Penal ofertadas por decisão
do STF, confirmando-se, desse modo, sua condição de filial do Supremo
Esse composto orgânico denominado mais amplamente de Justiça Eleitoral,
que tem no topo o TSE, controla todo o processo eleitoral, sua apuração e o pós
eleitoral como instância penal, recebeu em 2020 a quantia de (02) dois bilhões e 100
(cem) milhões de reais do orçamento da União.
O impasse criado pela adoção do voto impresso, acabou revelando a
verdadeira função da Justiça Eleitoral, com aproximadamente 15 (quinze) mil
servidores, se tornando um braço armado do STF, sustentando e ampliando seu poder
coercitivo, muito além do desejado, até mesmo para um Tribunal Constitucional, como
deveria ser.
Cabe ao Congresso Nacional, recuperar seu poder, originário decorrente da
soberania do voto popular, e corrigir a trajetória da Justiça Eleitoral. Sua reforma
deverá assegurar-lhe a plena autonomia diante do STF, alterando sua composição,
redefinindo suas atribuições, garantindo a rotatividade de seu comando, atualmente
privativa dos Ministros do STF e até mesmo modificando sua nomenclatura de TSE
para Tribunal Federal Eleitoral.
O esgotamento desse modelo de Justiça Eleitoral é visível e comprometedor
para a garantia de um resultado eleitoral transparente e seguro, sobretudo num
momento onde as eleições ocorrerão em um ambiente de extrema polarização
ideológica, entre a direita e a esquerda, onde não pode existir a menor desconfiança
sobre o processo eleitoral, sobretudo de sua apuração. O resultado das eleições,
exibido com a clareza necessária, elevará a taxa de estabilidade do novo governo e
favorecerá a segurança jurídica e institucional do país.
A sociedade verdadeiramente democrática exige reformas que valorizem o voto
e fortaleçam a plenitude da cidadania.
Jorge Gama é advogado e ex-Deputado Federal.